Adeus, Minha Velha Amiga

Adeus, minha velha amiga

As malas se amontoavam como montanhas, cada uma guardando um pedaço da minha história. Olhava para elas e sentia um aperto no peito. Em breve, tudo aquilo seria transportado para uma nova cidade, para uma nova vida. Uma parte de mim ansiava por essa mudança, por novos ares, por novas experiências. Mas outra parte, a maior, se agarrava ao que conhecia, ao que era familiar.

Lembro-me de quando cheguei a esta cidade. Era uma menina, cheia de sonhos e expectativas. Corri por estas ruas, brinquei nesses parques, conheci pessoas que se tornaram como família. Cada canto, cada esquina, guardava uma memória, um segredo, um pedacinho do meu coração. E agora, tudo isso estava prestes a se tornar uma lembrança distante.

A janela do meu quarto, que antes me presenteava com a vista de um pôr do sol espetacular, agora parecia um quadro sombrio. O vento brincava com as cortinas, como se estivesse tentando me dizer algo, um aviso talvez, sobre a imensidão da mudança que se aproximava. Sentei-me na cama e deixei que as lágrimas rolassem pelo meu rosto.

A saudade já começava a se instalar, como uma planta que cresce em um terreno fértil. Saudade da minha rua, da padaria da esquina, do banco da praça onde costumava ler, da escola onde fiz tantos amigos. Saudade da minha casa, com seus cômodos que me acolhiam, com seus cheiros familiares, com seus objetos que guardavam tantas histórias.

Sei que a vida é feita de ciclos, de idas e vindas. Que a mudança é necessária para o crescimento. Mas, por mais que eu tente me convencer disso, a dor da despedida é imensa. Afinal, como posso deixar para trás um lugar que me viu crescer, que me viu sorrir e chorar, que me moldou como pessoa?

A mudança é como um livro que se fecha em um capítulo importante, mas que promete uma nova história. Uma história que ainda não conheço, mas que espero que seja tão bonita quanto a que vivi até aqui.

E assim, com o coração dividido entre a saudade e a esperança, me despeço da minha velha amiga, a cidade que me acolheu e que, para sempre, fará parte de mim.

Eu só queria dançar sem lembrar dos motivos que me fizeram abandonar a mim mesma.

Mas

não

consigo.

A vida, em sua infinita sabedoria, é persistente. Mesmo nas profundezas do inverno, a semente guarda em si a promessa da primavera. E assim como a árvore, que a cada ano se renova, também nós, seres humanos, somos capazes de renascer das cinzas.

Filhos-pássaros

Pequenos corpos frágeis, buscam o calor do ninho. Olhos grandes, cheios de perguntas, absorvem o mundo com avidez. Asas ainda pequenas, batem timidamente. Primeiro voo, um salto de fé, um aprendizado constante. O ninho, um porto seguro, mas o mundo, um convite irresistível. Explorar, descobrir, construir o próprio caminho… Pais, guias e protetores, ensinam a voar, a cair e a levantar. Mas o céu é vasto, e cada pássaro traça sua rota. O tempo passa, os ninhos se esvaziam, mas o amor permanece. Filhos, pássaros em pleno voo, levando consigo um pedaço do coração dos pais.

A falta que a falta faz

A ausência, paradoxalmente, se faz presente em cada canto, em cada silêncio. É como um fantasma que ronda os corredores da memória, tangível em seu vazio.

Entre Aspas

A vida, essa grande orquestra de acontecimentos, às vezes desafina de maneira cruel. Nos deparamos com partituras complexas, repletas de notas incertas, e somos convidados a improvisar, a encontrar melodias onde só há ruído. Nesses momentos, a inconstância se revela em sua forma mais aguda, jogando-nos em um mar de dúvidas.

Lembro-me de uma dessas passagens, quando a vida me colocou entre aspas. Uma situação-chave, como dizem, onde cada nota tocada ecoaria por longos anos. Senti-me como um ator amador, no centro de um palco iluminado, sem saber qual máscara usar. O público, ansioso, aguardava minha próxima fala, mas as palavras se recusavam a sair.

A inconstância da vida, nesse instante, era palpável. Um segundo antes, eu tinha um roteiro bem definido, um futuro traçado a lápis. No segundo seguinte, tudo se desfez como um castelo de areia. A incerteza se instalou, como uma névoa densa, obscurecendo meus sentidos.

Nesses momentos de fragilidade, a mente vaga por caminhos tortuosos, buscando respostas em lugares improváveis. Revivemos memórias, analisamos escolhas passadas, e nos perguntamos se poderíamos ter agido de outra forma. A culpa, incômoda companheira, se instala, alimentando a sensação de impotência.

Mas a vida, em sua infinita sabedoria, nos oferece a oportunidade de aprender com cada tropeço. A experiência, essa grande professora, nos ensina que a inconstância é parte integrante da jornada. Não há um manual de instruções para lidar com as situações-chave, e a única certeza que temos é a da própria incerteza.

Ao final, resta-nos aceitar que a vida é um labirinto sem mapa, e que cada um de nós é responsável por encontrar seu próprio caminho. E mesmo que as respostas não venham de imediato, é importante lembrar que a jornada em si é um presente, e que a felicidade se encontra nos pequenos momentos, nas conexões que estabelecemos e nas lições que aprendemos ao longo do caminho.