Apenas um homem supérfluo.

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Uma Crnica Mrbida

Uma crônica mórbida

Era 2017, dia 15 de Junho, eu me lembro de ainda fazer parte daquela instituição religiosa pentecostal. Naquele dia eu estava na casa de um conhecido, em meio à muitos jovens cristãos, num evento que eles chamam de tocata.

Naquele dia eu me lembro de sentir uma sensação estranha, como se pudesse sentir o cheiro da morte. Era fim de tarde, e eu observava o céu atentamente. Me retirei daquela casa onde havia muitos conhecidos. Saí daquela tocata e fui até o hospital, onde minha mãe se encontrava internada há duas semanas. A história dela eu contarei com mais detalhes em outros textos.

Enquanto me encaminhava até o hospital eu contemplava o céu, embora estivesse um céu limpo, um azul vivo, no meu coração havia trevas, como se estivesse em um mar gelado, repleto de uma leve escuridão.

Entrei no hospital, subi até o segundo andar, e lá estava ela, com uma leve expressão no rosto. Quando coloquei a mão na testa dela senti seu corpo frio, e logo em seguida segurei suas mãos. Tudo o que podia fazer era chorar.

Naquele momento eu não pensei em nada, só chorava, e contemplava a frieza da morte, o cérebro ainda não conseguia assimilar o peso da perda.

Se eu pudesse descrever a sensação de lidar com a morte diante de mim, eu diria que ela é fria, é como nadar em um mar cinza, com pedras de gelo ao seu redor, com uma leve neblina. E depois, seu coração é tomado por um vazio imensurável.

O verdadeiro peso da morte veio depois de tudo isso. Depois de ver ela sendo enterrada naquele caixão, depois do velório agonizante, onde naquele momento mórbido, havia toda sorte de condolências, inclusive lágrimas de crocodilo.

Durante 10 anos eu vi minha mãe definhando em uma doença mental, à mercê de um estado psicótico, estava a base de fortes remédios, que apenas nos seus dois últimos anos de vida lhe deram alguma instabilidade mental. A doença que a matou, segundo os médicos, não tinha relação com sua depressão pós-parto e com seu estado psicótico. Era uma doença cerebral viral.

A morte da minha mãe mudou minha percepção da realidade, e consequentemente agravou uma intuição niilista dentro de mim. Essa percepção sempre esteve lá, embora na época eu sequer tivesse vocabulário para definir esse aspecto psicológico e cosmológico da minha personalidade.

Naquele momento um jovem adulto de fé, começou a passar por um processo profundo de niilismo. Foi um processo lento, fui definhando mentalmente aos poucos, junto às minhas crises existenciais e baixa autoestima, até cogitei o suicídio.

Tentei me reconciliar com a fé nesse meio tempo, mas não houve uma restauração efetiva. Até que finalmente o niilismo total se estabilizou. Através do conhecimento, passei a tentar compreender o sentido da vida, e o sentido da morte. Busquei mais do que nunca, compreender o que significa ter um propósito na vida.

Eu costumo dizer para mim mesmo em meus devaneios, que sou um existencialista de nascença. Desde muito novo eu queria desesperadamente saber: qual é o verdadeiro valor da existência? Frase que eu costumava proferir em meus pensamentos constantemente.

A morte mudou para sempre a minha vida, e passei a compreender de forma muita concreta, que ela é tão real quanto cada dia que vivemos.

O drama da fase atual da minha vida é: Como viver a minha vida sem desperdiçar-la? Sem deixar de aproveitar a cada dia? Afinal, vivemos todos os dias. Cada dia é uma chance de agarrar essa existência em nossas mãos.

Pois bem, sou um homem adoecido, não no sentido em que minha mãe se encontrava, mas na tristeza que sempre esteve no meu coração, e que nos últimos 7 anos vem se agravando.

Tenho sonhos, planos, desejo de terminar a faculdade. Mas estou paralisado pela ansiedade, imerso numa procrastinação infernal. E quando estou encurralado, me lembro da triste e fria cena, minha mãe naquele leito de morte.

~Em memória de Joseane A. G. (1979-2017) 🖤

  • mahfilhadedeusblog
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Tenho aquele humor pessimista meio depressiativo que gera várias risadas e um suspiro no final

No conhecimento eu encontrei uma chance de libertação.

O vazio que sempre senti, sempre foi, em nome do meu idealismo do amor. Ilusão intragável que me tomou. As noites de ansiedade, os dias tristes e melancólicos, são por conta dessa triste ilusão. Ah! Quem dera eu não fosse um ser faltante.

Desde adolescência eu me lembro das noites solitárias em que sonhei com o tal "amor romântico". Quantas vezes me imaginei desfrutando de sinceros abraços e beijos, de gestos e olhares profundos.

Me vejo como um homem patético, pois o meu tendão de Aquiles, meus vícios, minhas noites solitárias, e em parte a causa da minha ansiedade, é por conta desse ridículo sonho de um amor romântico. Uma mulher, quem sabe, que me ame.

Que triste ilusão! Esperando que o outro cessará a angústia atávica. A angústia é a substância da alma, como dizia Sören Kierkegaard.

Certa feita, a psicanalista Maud Mannoni lançou uma poderosa sentença à condição do ser humano, em nome de Lacan: "O maior desejo do ser humano, é o de ser desejado pelo outro."

Eis a nossa condição miserável, somos seres faltantes, desejantes, e acima de tudo, queremos ser desejados pelo outro. Que espécie infeliz!

E eu, como um animal faltante que sou, carrego a minha miséria. À este mundo, só tenho à oferecer essa miséria. A condição de homem supérfluo. Nada mais.


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Ter uma sensibilidade trágica é essencial para entender a nossa condição e nossos limites enquanto humanos, em uma existência absurda como a nossa. Mas nem só de tragédia se constituiu nossas pobres existências, nossa estrutura mental também trás consigo esperança.

Não precisa ter pressa.

Não há necessidade de brilhar.

Não precisa ser ninguém além de si mesmo.

(Virginia Woolf)

No Precisa Ter Pressa.

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